Dois grilhões na literatura do Amazonas

Há duas claras tendências constitutivas na literatura feita por aqui, principalmente quando falamos dentro de um certo fio de oficialidade, de produção institucionalmente referendada por academias, e que fazem com que boa parte das obras sempre pareçam a reprodução estática de um mesmo monumento, um pedregulho imóvel, a estátua na praça da qual se extraem os modelos de nosso tempo.

A primeiro delas é a natureza. Já falou Márcio Souza há décadas que na Amazônia a floresta engole o homem, apesar dele próprio ter caído nessa tentação diversas vezes. O hipnotismo da imensidão das águas e do verde é uma força irresistível, de maneira que nos sentimos constantemente tentados em retratá-lo em sua magnitude, esquecendo-se com isso de que é o conflito humano que atualiza suas imagens, e de que sem ele a própria selva, que sem dúvida não perderá nada de sua exuberância, não terá nada a dizer literariamente, sendo muito mais propícia a ser relatada pelas mãos de um pintor exímio ou de outros artistas visuais.

O segundo elemento é o lirismo. Quanto a esse, já não há mais desculpas. Se a exposição declarada e repetitiva de sentimentos e sensações foi o ápice de estéticas vitoriosas e fundadoras, hoje, no mundo desencantado, ela não encontra o que fazer, afora gerar uma série de cantilenas desgastantes que tornam o amor e outros afetos ainda menores do que eles podem ser ao indivíduo contemporâneo. Claro, alguém diria que a emotividade pode ser revigorada, mas um gênio para tal certamente ainda não apareceu, nem parece que virá entre nós.

É certo que uma literatura pulsante não depende apenas de nos desfazermos dessas amarras renitentes. Contudo, é um começo imprescindível para tanto. Que as criações do passado mantenham sua glória e reverência, pois escreveram aos indivíduos presentes em sua ocasião. Que façamos o mesmo, é o mínimo que se exige para continuarmos de fato indo adiante.